terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Decreto não consegue conter expansão de favelas

Pedro do Coutto - Tribuna da Imprensa, 13 de janeiro de 2009.

Reportagem de Fábio Vasconcelos e Cristiane de Cássia, “O Globo”, de 12 de janeiro, focaliza a intenção revelada pelo prefeito Eduardo Paes de, através de decreto, conter a expansão das favelas do Rio. Isso de um lado. De outro, adotar a Vila Canoas, em São Conrado, como modelo de habitação de conglomerados de baixa renda que se verticalizam na cidade. A foto está publicada na primeira página. Se decretos conseguissem mudar o rumo dos fatos, não haveria problema no mundo.

Bastaria uma assinatura, acompanhada do respectivo marketing, e tudo estaria resolvido. Não é assim. A favelização da cidade é um processo extremamente crítico e progressivo que tem suas raízes na política de emprego e salário. Esta deveria estabelecer que os rendimentos do trabalho não perdessem para a inflação. Pelo menos a encontrada pelo IBGE ou pela FGV. Mas isso não acontece.

Em 1961, início do governo Lacerda na antiga Guanabara, hoje cidade do Rio de Janeiro, o Secretário de Planejamento, Helio Beltrão, e o chefe da Casa Civil, Rafael de Almeida Magalhães, realizaram um levantamento sobre áreas favelizadas. Encontraram uma população de 300 mil moradores para o total de 3 milhões de habitantes: 10%, portanto.

Hoje, o Rio possui 6 milhões de habitantes e 2 milhões de moradores em favelas. A parcela de sub-habitação, que era de dez por cento, saltou para pouco mais de trinta por cento. Era idéia de o governador Lacerda remover as favelas. Tornou-se impossível com o passar das décadas. Basta ver o seguinte: 2 milhões de pessoas requer algo em torno de 400 mil casas. Impossível.

O processo de favelização não surgiu por acaso. É uma consequência do aumento do desemprego e das perdas salariais acumuladas. Em 1963, último ano de mandato do presidente João Goulart, o PIB era de 80 bilhões de dólares, como revelou estudo do professor Claudio Contador, da UFRJ.

Dois terços eram formados pela massa salarial, um terço pela remuneração do capital, como é hoje nos EUA para um PIB de 15 trilhões. Em 85, quando se encerrou o ciclo dos militares no poder, e Sarney assumiu a presidência da República, o PIB era equivalente a 375 bilhões de dólares. Mas a pirâmide se invertera: a participação do capital subiu de 1 para 2 terços, a do trabalho caiu de 2 para 1 terço.

A favelização começou a disparar.

Hoje, para um PIB de 800 bilhões de dólares, a proporção é a mesma de 85. O processo de sub-habitação, claro, não recuou. Pelo contrário.

Avançou ainda mais. Para que ele recue, é preciso que a política de salários se altere e o desemprego desça, pelo menos para, 5 por cento. Hoje, ele se encontra perto de 8 por cento.

A força de trabalho é formada por 95 milhões de pessoas, metade da população brasileira. Decretos municipais não podem conter a progressão da crise. Isso somente é possível com a eliminação das causas.

Mas no início da matéria, citei a foto que “O Globo” publicou da Vila Canoas que, a exemplo do Alto Leblon e Alto Gávea, encurta a distância entre favelas e residências urbanas. Não serve, francamente, de exemplo.

A imagem reflete, sobretudo, pouca solidez nas construções, inclusive feitas em encostas. O prefeito Eduardo Paes tem razão, é claro, em querer conter a expansão das favelas. Procura fazer sua parte, é verdade. Mas a solução não está em sua caneta. Está na política social e trabalhista do País. Esfera do presidente Lula.

Um comentário:

romay disse...

Entre 1940 e 1960 o percentual de imóveis alugados no Rio de Janeiro caiu de 65 para 48%. Essa diferença percentual é quase a mesma do crescimento de moradores de favelas.

Curioso notar que a população economicamente ativa residente nas favelas também cai no período... mais até que este percentual.