O que está abaixo reproduzido é um diálogo no
Facebook motivado pelo fato de que o dono deste blog Satyagraha (‘apreço
pela verdade’) ousou mencionar a beleza de Manuela d’Ávila num post em que
apresentou, editada, a carta que ela escreveu a Joice Hasselmann. O episódio é
um pitoresco exemplo de como... não, não: é melhor que cada um tire suas
conclusões.
Nelson M. Mendes
__________
Nelson Moraes Mendes
Manuela
d'Ávila é inteligente, tem boa índole, é combativa, e é linda. (Se eu tivesse
30 anos menos e fosse solteiro...) Mas, além disso, ela também sabe fazer um
texto agridoce, misturando ironia e sinceridade em doses homeopaticamente
equilibradas. Uma coisa digna de Machado de Assis ou Luis Fernando Verissimo!
Eu editei a carta que ela escreveu para Joice Peppa Pig Chorona Hasselmann:
Cara Joice,
Como vai? Recentemente participamos da gravação do
podcast do “agora que são elas”.
Naquela ocasião você ainda era líder do governo e
divergia de mim com relação a existência do machismo no congresso nacional.
Bastava “se impor no grito que tudo estaria resolvido”. Fico sinceramente
triste por você ter percebido, na prática, que aquilo que eu dizia era real de
uma maneira tão brutal e cruel. O machismo existe ali porque existe no mundo.
Não é fácil. Não é mesmo nada fácil ser mulher e cair
nas mãos da milícia virtual que governa o Brasil.
No ano de 2015, Joice, enquanto você estava nos
caminhões de som da Avenida Paulista, ao lado daqueles meninos que divulgavam
imagens terríveis da Presidente Dilma, eu estava grávida e aqueles meninos
inventaram que eu fiz uma viagem - com dinheiro público - para Miami para
comprar um enxoval para Laura. Eu não conheço Miami, Joice. Nem sequer fiz
enxoval. Meu enteado tinha onze anos. Por isso, Joice, sei bem como é horrível
ver o filho de onze anos receber mentiras pela internet a respeito da mãe.
Esses dias Laura me perguntou se vocês do governo
odiavam também a nossa gatinha. Ela me disse que sabia que vocês odeiam a mim e
a ela. Mas ela precisava saber se a gata estava protegida da ira física que
sofremos em função daquilo que as milícias virtuais constroem com suas
mentiras.
Isso não acontece só comigo. Maria do Rosário viu sua
filha exposta. Jean Wyllys saiu do Brasil. Marielle Franco tem sua memória
destruída todos os dias. Não é por nada que dedico parte de minha vida ao
combate de fakenews e a contar essas histórias. Para que as pessoas tenham
ideia do que passamos
Joice, eu sou sinceramente solidária a você porque
sei o que você está vivendo.
Mas queremos e precisamos que você fale. Você pode
informar à polícia, ao poder judiciário e à opinião pública tudo o que sabe
sobre essa gangue que espalha mentiras para destruir as pessoas e, assim, governar ao Brasil.
Precisamos que você faça isso para que nenhuma outra
pessoa passe pelo estamos passando, para que mais nenhuma filha ou filho sofra
em meio a esse jogo sujo.
Um abraço solidário,
Manuela d'Ávila
Manuela d'Ávila
___
C. Por que a
beleza física sempre tem que entrar na lista de qualidades de uma pessoa
política, quando ela é do sexo feminino ?
___
Nelson Moraes Mendes Porque a aparência física é o 'rótulo'
das pessoas, queiramos ou não. Tente esquecer, descartar a imagem física de
qualquer pessoa, homem ou mulher, que você admire, deseje, odeie, despreze.
Aceita o desafio?
Eu não acho nada de mais fazer referência à beleza de uma mulher. Manuela d'Ávila não me chama a atenção porque é bonita; mas por todas as outras qualidades que enumerei antes: inteligência, boa índole, combatividade. Coloquei a beleza no fim da lista por tal motivo, e também exatamente para evitar críticas 'feministas'. Na verdade, eu preparei o ‘gancho’ para fazer o gracejo de que, com 30 anos menos e solteiro, eu poderia me interessar por ela. Foi o modo de enfatizar ‘literariamente’ o quanto eu acho Manuela interessante.
Eu não acho nada de mais fazer referência à beleza de uma mulher. Manuela d'Ávila não me chama a atenção porque é bonita; mas por todas as outras qualidades que enumerei antes: inteligência, boa índole, combatividade. Coloquei a beleza no fim da lista por tal motivo, e também exatamente para evitar críticas 'feministas'. Na verdade, eu preparei o ‘gancho’ para fazer o gracejo de que, com 30 anos menos e solteiro, eu poderia me interessar por ela. Foi o modo de enfatizar ‘literariamente’ o quanto eu acho Manuela interessante.
Nelson Moraes Mendes E mais: o que eu destaquei, na minha
introdução, foi que, além de ter todas essas qualidades, ela é capaz de fazer
uma carta que é um primor de equilíbrio entre sinceridade e ironia, apoio e
crítica. "Uma coisa digna de Machado de Assis ou Luis Fernando
Verissimo!" - escrevi.
___
C. Nelson Moraes Mendes Haha. Também sabia que sua resposta
seria essa 😅
No caso do racismo, seria o equivalente do “Racista, eu? Imagina, tenho até um amigo negro?”, rs.
Enfim, pessoas muito mais inteligentes que eu já teorizaram o que hoje é qualificado de “estereótipo de gênero”, se não me engano e o “gracejo” só confirma AINDA MAIS esse aspecto.
Qual é o desafio? Mostrar que quando se trata de homens políticos as manchetes de grandes meios de comunicação também se referem à beleza do homem ? Ou dos seus próprios posts ? 🤷🏽♀️
No caso do racismo, seria o equivalente do “Racista, eu? Imagina, tenho até um amigo negro?”, rs.
Enfim, pessoas muito mais inteligentes que eu já teorizaram o que hoje é qualificado de “estereótipo de gênero”, se não me engano e o “gracejo” só confirma AINDA MAIS esse aspecto.
Qual é o desafio? Mostrar que quando se trata de homens políticos as manchetes de grandes meios de comunicação também se referem à beleza do homem ? Ou dos seus próprios posts ? 🤷🏽♀️
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Nelson Moraes Mendes Só para entender: você sabia que
minha resposta seria “essa” – qual?... A sua referência ao caso do racismo é
conhecida; mas não consigo entender como ela se aplica ao meu caso.
Você deveria ter sido também mais explícita quando enfiou a expressão “estereótipo de gênero” no meio da conversa. Isso me lembra que, no fim da ditadura, em meados dos anos 80, o clima de liberdade política propiciou o aparecimento de vários programas de debates na TV; todo mundo queria expressar sua opinião. Num desses debates, reunindo várias pessoas, entre celebridades, estudantes e intelectuais desconhecidos, um estudante deu um jeito de enfiar uma menção a Max Weber. Depois foi a vez de o psicanalista Eduardo Mascarenhas falar, e ele colocou o dedo na ferida: “Você falou em Max Weber só para exibir erudição [...]”
Num debate honestamente conduzido, convém evitar arremessos aleatórios de expressões que já ganharam um selo de ‘excelência acadêmica’, ou que estão ancoradas no terreno questionável do ‘politicamente correto’. “Estereótipo de gênero”... Você provavelmente acha que eu não tenho o direito de fazer perguntas a respeito disso, porque esse não é o meu “lugar de fala”.
Nos meus tempos de faculdade, as expressões da moda eram outras; mas, em geral, igualmente vazias e questionáveis: rótulos em geral usados pelos que não tinham muito a dizer.
Veja você: das 25 pessoas que curtiram até agora o post em que apresentei minha edição da carta de Manuela (era um pouco longa, as pessoas têm preguiça de ler textão), 17 são mulheres. Nem todas conheço pessoalmente; mas são todas esclarecidas, e muitas com postura decididamente feminista. E todas elas – mesmo as que só conheço virtualmente – SABEM que não existe a menor chance de que eu possa ser acusado de machismo ou qualquer tipo de preconceito. Mas é óbvio que não vou pedir que minhas amigas se manifestem; tampouco vou falar a respeito de minha trajetória de vida, de minhas posturas, meus escritos.
Eu aprendi, aqui mesmo nas redes sociais, que não adianta conversar com quem vem com ideias pré-concebidas. Minha mulher costumava me criticar porque eu perdia um tempo enorme fazendo comentários elaborados, com lógica e fundamentação factual, para ver depois o interlocutor responder qualquer besteira – e ainda achando que estava ‘lacrando’.
O seu comportamento lembra o de Moro e o de todos aqueles procuradores de pelo em ovo: a premissa era a de que Lula era criminoso. Já que você aprecia citações, escreveu o jurista Afranio Silva Jardim no parecer que preparou, para a ONU, sobre o ‘lawfare’ (perseguição política por meios jurídicos) contra Lula: “[...] escolheram o ‘criminoso’ e estão agora procurando o crime …” Um outro jurista, Eugênio José Guilherme de Aragão, analisando as arbitrariedades cometidas já no processo do “Mensalão”, escreveu: “Os procuradores partiram, a priori, da existência de uma organização criminosa [...] O problema de teorias investigativas é que, se estáticas, incidem sobre grave violação do princípio da presunção de inocência.[...] As provas que vão chegando ao processo são empurradas, piladas, socadas para dentro das categorias pré-concebidas.”
Qual era a ‘teoria’ – melhor dizendo, ‘convicção’?... A de que eu, ao falar na beleza de Manuela d’Ávila, cometi crime explícito de machismo, exprimi meu desdém pelas mulheres, mostrei que, para mim, mulher só merece realmente respeito se for bonita.
O fato de que na minha apresentação eu tenha destacado principalmente a refinadíssima capacidade literária de Manuela para equilibrar ironia e sinceridade, apoio e cobrança – isso não teve qualquer importância; o importante era assinalar que eu mostrei meu preconceito ao falar na beleza de Manuela.
Bem, eu vou contar uma coisa: eu conheci uma mulher que tinha os mais belos olhos que já vi. E ela não me despertava qualquer interesse erótico, não me provocava o ‘macho alfa oculto’. Na verdade, ela era uma tia-avó. A beleza vinha do que se podia perceber através dos olhos (tradicionalmente conhecidos como “janelas da alma”): amor, compaixão, sabedoria.
A beleza de Manuela é a que brilha em seu interior e atravessa o invólucro físico.
Você deveria ter sido também mais explícita quando enfiou a expressão “estereótipo de gênero” no meio da conversa. Isso me lembra que, no fim da ditadura, em meados dos anos 80, o clima de liberdade política propiciou o aparecimento de vários programas de debates na TV; todo mundo queria expressar sua opinião. Num desses debates, reunindo várias pessoas, entre celebridades, estudantes e intelectuais desconhecidos, um estudante deu um jeito de enfiar uma menção a Max Weber. Depois foi a vez de o psicanalista Eduardo Mascarenhas falar, e ele colocou o dedo na ferida: “Você falou em Max Weber só para exibir erudição [...]”
Num debate honestamente conduzido, convém evitar arremessos aleatórios de expressões que já ganharam um selo de ‘excelência acadêmica’, ou que estão ancoradas no terreno questionável do ‘politicamente correto’. “Estereótipo de gênero”... Você provavelmente acha que eu não tenho o direito de fazer perguntas a respeito disso, porque esse não é o meu “lugar de fala”.
Nos meus tempos de faculdade, as expressões da moda eram outras; mas, em geral, igualmente vazias e questionáveis: rótulos em geral usados pelos que não tinham muito a dizer.
Veja você: das 25 pessoas que curtiram até agora o post em que apresentei minha edição da carta de Manuela (era um pouco longa, as pessoas têm preguiça de ler textão), 17 são mulheres. Nem todas conheço pessoalmente; mas são todas esclarecidas, e muitas com postura decididamente feminista. E todas elas – mesmo as que só conheço virtualmente – SABEM que não existe a menor chance de que eu possa ser acusado de machismo ou qualquer tipo de preconceito. Mas é óbvio que não vou pedir que minhas amigas se manifestem; tampouco vou falar a respeito de minha trajetória de vida, de minhas posturas, meus escritos.
Eu aprendi, aqui mesmo nas redes sociais, que não adianta conversar com quem vem com ideias pré-concebidas. Minha mulher costumava me criticar porque eu perdia um tempo enorme fazendo comentários elaborados, com lógica e fundamentação factual, para ver depois o interlocutor responder qualquer besteira – e ainda achando que estava ‘lacrando’.
O seu comportamento lembra o de Moro e o de todos aqueles procuradores de pelo em ovo: a premissa era a de que Lula era criminoso. Já que você aprecia citações, escreveu o jurista Afranio Silva Jardim no parecer que preparou, para a ONU, sobre o ‘lawfare’ (perseguição política por meios jurídicos) contra Lula: “[...] escolheram o ‘criminoso’ e estão agora procurando o crime …” Um outro jurista, Eugênio José Guilherme de Aragão, analisando as arbitrariedades cometidas já no processo do “Mensalão”, escreveu: “Os procuradores partiram, a priori, da existência de uma organização criminosa [...] O problema de teorias investigativas é que, se estáticas, incidem sobre grave violação do princípio da presunção de inocência.[...] As provas que vão chegando ao processo são empurradas, piladas, socadas para dentro das categorias pré-concebidas.”
Qual era a ‘teoria’ – melhor dizendo, ‘convicção’?... A de que eu, ao falar na beleza de Manuela d’Ávila, cometi crime explícito de machismo, exprimi meu desdém pelas mulheres, mostrei que, para mim, mulher só merece realmente respeito se for bonita.
O fato de que na minha apresentação eu tenha destacado principalmente a refinadíssima capacidade literária de Manuela para equilibrar ironia e sinceridade, apoio e cobrança – isso não teve qualquer importância; o importante era assinalar que eu mostrei meu preconceito ao falar na beleza de Manuela.
Bem, eu vou contar uma coisa: eu conheci uma mulher que tinha os mais belos olhos que já vi. E ela não me despertava qualquer interesse erótico, não me provocava o ‘macho alfa oculto’. Na verdade, ela era uma tia-avó. A beleza vinha do que se podia perceber através dos olhos (tradicionalmente conhecidos como “janelas da alma”): amor, compaixão, sabedoria.
A beleza de Manuela é a que brilha em seu interior e atravessa o invólucro físico.
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