Texto original de Ângela Carrato no Viomundo
Texto
editado – NMM:
Sem citar
nomes de fontes, a jornalista Malu Gaspar, de O Globo (a de blusa laranja na foto), publicou na
segunda-feira (22), texto cujo objetivo é óbvio: levantar dúvidas sobre a
atuação do ministro do STF, Alexandre de Moraes, no caso do banco Master e
fornecer munição para os combalidos centrão e extrema-direita.
O que a
jornalista fez lembra as primeiras notícias que apareceram em O Globo,
nos idos de 2014, quando a oposição ao governo da presidente Dilma Rousseff
ainda não tinha tomado as proporções que tomou.
Sobre Malu
Gaspar, é importante não perder de vista seu lavajatismo militante. O livro,
por ela escrito, “A Organização: a Odebrecht e o esquema de corrupção que
chocou o mundo”, lançado seis meses após a saída de Moro do Ministério da
Justiça, possivelmente seria peça importante para Moro em eventual campanha
para a presidência da República.
A maioia do
Congresso Nacional apoiou o golpe contra Dilma; e o STF (pressionado por
militares e pelos EUA) endossou a decisão ilegítima.
Os seis anos
de governos golpistas de Michel Temer e Jair Bolsonaro só foram possíveis,
porque a aliança entre maioria parlamentar e STF se manteve. Aliança que
começou a ruir quando a Suprema Corte, diante das evidências dos desmandos do
então juiz Sergio Moro, não teve outro caminho a não ser colocá-lo sob
suspeição e anular as sentenças contra Lula.
A vitória de
Lula na eleição para presidente em 2022 era um dado com o qual Bolsonaro e seus
aliados não contavam. Não apenas eles.
Contra Lula,
como sempre estavam a classe dominante, que se pauta pelos interesses de
Washington, parcela significativa dos militares e a totalidade do chamado
mercado financeiro.
___
A tentativa
de golpe de estado com uma semana de Lula no poder precisa ser vista como parte
de um roteiro adotado pela extrema-direita nacional e internacional para manter
o Brasil submisso.
Em 2026,
Lula será candidato à reeleição, com grandes chances de vitória. Como direita e
extrema-direita brasileiras se encontram fragilizadas, de novo o grupo Globo
parece assumir o papel de principal partido de oposição no país.
Entretanto,
se a bilionária família Marinho, proprietária do grupo Globo, continua inimiga
de governos progressistas, a realidade brasileira mudou muito.
Não existe
mais aquela aliança entre a maioria do Congresso Nacional e o STF. Desde a
tentativa de golpe em 8 de janeiro de 2023, a relação entre os três Poderes
alterou-se substancialmente.
Se na Câmara
dos Deputados, ainda predomina uma maioria golpista e sem compromisso com o
Brasil e o povo brasileiro, no Senado o golpismo é menor.
Já o STF se
colocou como guardião da democracia.
Há, no
entanto, um ponto de convergência entre o governo Lula e ministros do STF, que
vem desagradando profundamente a esta mídia: o combate à corrupção no “andar de
cima”.
Enquanto os
“bandidos” eram pobres, pretos e moradores de favelas, não havia problema serem
mortos às centenas, como fez o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro.
Quando a
corrupção exposta passou a ser a de poderosas fintechs, com sedes na avenida
Faria Lima, coração financeiro de São Paulo, que lavam dinheiro para o Primeiro
Comando da Capital (PCC) ou a do dirigente do recém liquidado Banco Master,
começam os problemas.
As operações
da Polícia Federal envolvendo ricos e poderosos desaparecem da mídia em prazo
recorde.
Não se fala
mais no andamento da Operação Carbono Oculto e muito menos nos desdobramentos
do fim do banco Master.
Tanto a
Operação Carbono Oculto quanto a liquidação extrajudicial do Master expuseram
ligações e atuações nada republicanas de parlamentares e governadores
oposicionistas. A operação Valor Total, da PF,
encontrou na casa do líder da oposição na Câmara dos Deputados, Sóstenes
Cavalcanti, R$ 469,7 mil em dinheiro.
O
parlamentar se enrolou todo ao tentar explicar a origem do dinheiro.
Mesmo não
sendo nada comum alguém ter quase meio milhão de reais em casa e não saber a
sua procedência, o assunto desapareceu da mídia.
Você deve
estar se perguntando qual a relação dessas operações da PF com o texto da
jornalista Malu Gaspar. Já chego lá.
Se o
ministro Alexandre de Moraes é o responsável por autorizar ações da PF
envolvendo ações dos golpistas, por ser o relator da matéria no STF, o ministro
Flávio Dino tem tido o mesmo papel em relação à falta de transparência das
emendas parlamentares, que abocanham mais de R$ 50 bilhões do orçamento da
União.
Em várias
oportunidades estas ações têm se cruzado. Vale dizer: vários golpistas são
também suspeitos de corrupção ou possuem ligações estreitas com corruptos.
Percebe,
caro(a) leitor(a), como o cerco vai se fechando?
A esse cerco
se soma também a resistência do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, em
aprovar a indicação do Jorge Messias para a vaga do ministro Luis Barroso.
Alcolumbre alegou
compromisso com o nome do senador Rodrigo Pacheco para o cargo.
O apoio ao
nome de Pacheco, já descartado, parece ter se pautado mais pelo temor de
Messias ser mais um ministro que venha se somar às atuações implacáveis de
Alexandre de Moraes e de Flávio Dino.
Chegamos
assim finalmente ao ministro Alexandre de Moraes.
Se o
jornal O Globo quisesse fazer jornalismo sério, o editor de
política deveria ter pedido que Malu Gaspar nominasse pelo menos algumas das
suas fontes citadas em off.
Como
professora de Jornalismo na UFMG, ensino que informação em off não
é para ser publicada. Deve servir como elemento para a apuração.
O jornalista
não pode afirmar, sugerir ou insinuar ação de quem quer que seja valendo-se
apenas de offs.
O nome disso
é irresponsabilidade, da mesma forma que um médico não pode fazer o diagnóstico
de um paciente por rumores ou por ouvir dizer.
Em qualquer
país onde existem órgãos que zelam pela ética da mídia, um texto como esse da
Malu Gaspar seria inaceitável.
E as razões
são muitas. O texto, seja qual for a resposta dada pelo ministro, alimentará as
dúvidas. Se, por outro lado, não houver resposta, o silêncio passa a ser
entendido como “tendo algo a esconder”.
Daí a
pergunta que não quer calar: a quais políticos ou setores interessam tentar
desmoralizar o ministro Moraes?
Malu Gaspar,
no programa Estúdio 1, da Globonews, deu sobre a matéria detalhes que não
explicaram nada e se pautaram por um monte de suposições.
Já na
terça-feira (23), outros veículos do grupo Globo assim a notícia: “Em nota,
Moraes tergiversa e não responde se conversou com Galípollo para pedir pelo
Master junto ao BC”.
Mais
capcioso, impossível.
As conexões
internacionais dos golpistas ficaram evidentes quando Donald Trump aplicou
tarifa de 50% a produtos brasileiros exportados para o seu país e e impôs a
Moraes e autoridades do governo Lula sanções com a lei Magnitsky.
Na semana
passada, as sanções contra Moraes foram levantadas. O fato serviu para a mídia
corporativa fazer muita fumaça, associando a decisão a um possível “acordão”
para aprovar o projeto de lei da Dosimetria, uma espécie de anistia branca aos
golpistas do 8 de janeiro, pois reduz significativamente as penas.
Lula, logo
após a aprovação do projeto, anunciou que tão logo chegue à sua mesa, vai
vetá-lo.
Da mesma
forma, não há por parte do ministro Moraes qualquer indicação de que a
dosimetria significará um afrouxamento geral das penas.
Ao
contrário. Bolsonaro e os militares graduados passarão muitos anos presos.
O grupo
Globo deflagrou essa tempestade contra o ministro Moraes porque sua esposa é
advogada do banco Master. Do ponto de vista legal, não há nenhum problema. O
advogado, em hipótese alguma, pode ser confundido com as ações de seu cliente.
Já do ponto
de vista ético, cabem, sim, questionamentos ao ministro Moraes, como cabem a
outros integrantes do STF, atuais e passados. Sabe-se, por exemplo, que
parentes de quase todos os ministros sempre advogaram na Corte.
Muitos
ministros participam de eventos aqui ou no exterior, regiamente pagos por
bancos e grandes grupos econômicos.
Até agora
nenhum veículo da mídia corporativa viu isso como corrupção ou tráfico de
influência.
De mais a
mais, dezenas de ministros e políticos conversaram com o presidente do Banco
Central sobre o banco Master. Por que Moraes é o único suspeito de tráfico de
interesses ou de lobby?
É
importante observar que a metodologia utilizada agora pelo grupo Globo é a
mesma adotada nos tempos da Lava a Lato.
O
jornal O Globo, através de um de seus colunistas, levanta um
assunto. O colunista, Merval Pereira, espécie de porta-voz da família Marinho,
publica também texto sobre o assunto. Sinal para os demais veículos do grupo
entrarem em campo.
Na
terça-feira (23), dia seguinte à publicação, esta era a manchete do portal UOL,
do grupo Folha de S. Paulo: “Magnitsky era o tema de reuniões de Moraes e BC,
Master foi citado”. Não acrescentou nada, mas reforçou insinuações.
Até um
estudante dos primeiros períodos de jornalismo sabe que citação em si não
significa nada.
Como se a
insinuação não bastasse, o UOL ainda buscou ativar na memória do seu público o
tema da corrupção, ao mencionar que o “Master ocupou espaço deixado pela
Odebrecht no pós-Lava Jato”.
Pronto. O
link entre a suposta corrupção de Moraes e a corrupção supostamente combatida
pela Lava Jato estava ativado. E o papel “salvador” da mídia também!
Esse tipo
despudorado de manipulação da memória das pessoas em relação à Lava Jato
explica por que o grupo Globo, até hoje, não informou para o seu público que os
heróis por ele criados, Moro e Dallagnol, eram na verdade bandidos.
O Jornal
Nacional aguarda os desdobramentos do tema junto aos formadores de opinião.
Daí a insistência de colunistas de O Globo e do grupo Folha ao
se mostrarem “perplexos” pela Procuradoria Geral da República e a Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) não terem tomado qualquer atitude.
Alguém se
lembra destes colunistas terem cobrado das instituições quando os julgamentos
da Lava Jato eram sumários ou quando Lula foi condenado sem qualquer prova e
cumpriu 580 dias de prisão?
As
barbaridades cometidas pela Lava Jato, patrocinadas e acobertadas pela mídia
corporativa, já seriam mais do que suficientes para que denúncias sem fonte e
linchamentos sumários não tivessem mais lugar entre nós.
Lamentavelmente,
isso é o que mais deve acontecer de agora em diante. A campanha eleitoral já
começou e a mídia corporativa tudo fará para buscar enfraquecer o governo Lula
e o STF, por enfrentarem os interesses do “andar de cima”, do qual a mídia é
parte.
Fazer
impeachment de ministro do STF é um dos sonhos da oposição.
Moraes é,
portanto, apenas a bola da vez.
*Ângela
Carrato é
jornalista, professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG e membro
do Conselho Deliberativo da ABI
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Para quem adora um meme:
Malu Gaspar 2

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