sábado, 26 de janeiro de 2013

As lições de Hugo Chávez

Por Beto Almeida

TEXTO EDITADO. Versão original em:


Desde que foi eleito em 1998, o presidente Hugo Chávez vem estimulando uma série de debates, seja em razão das amplas transformações sociais que promove na Venezuela, seja em razão do medo pânico que causa nos governos imperiais e nas oligarquias de cada país, vassalas e zeladoras dos interesses deste imperialismo em cada país. Certamente, sobre cada um destes aspectos é possível retirar profundas lições.

No caso brasileiro, a mídia do capital, que jamais se preocupou em oferecer informação  sobre as mudanças na Venezuela, agora promove uma comunicação necrológica, chega mesmo a torcer pela desaparição do mandatário venezuelano.

Para que serve a mídia?

Há alguns meses, quando cientistas iranianos foram assassinados em atentados,  num programa televisivo, Manhattan Connection,  das Organizações Globo, comentaristas chegaram a defender que aqueles cientistas iranianos mereciam mesmo ser assassinados. Apologia do homicídio!

Qual seria a reação do Itamaraty, do Governo Federal, caso emissoras de TV da Venezuela ou do Irã chegassem a torcer pela reincidência do câncer em Dilma ou em Lula? Ou se estas emissoras defendessem a morte de cientistas brasileiros, pois, como sabemos, o Brasil também possui seu próprio programa nuclear, como EUA, Rússia, China, Israel e Irã?


Estranho “ditador”

As notas que a mídia brasileira divulgam sobre Hugo Chávez são  inverdades grotescas. Um dos aspectos é  rotular Hugo Chávez como ditador. Estranho “ditador” que , em 14 anos, promoveu 16 eleições, referendos e plebiscitos, dos quais venceu 15 e respeitou o  único pleito em que não foi vencedor.

Auditoria eleitoral

Na Venezuela,  eleições não são julgadas pela mesma autoridade que as organiza. Além disso, as urnas possuem mecanismo de impressão do voto,  o eleitor o deposita em urna anexa. Isto possibilita  auditoria do voto, o que não ocorre no Brasil, onde as urnas eletrônicas são vulneráveis e não existe voto em papel para eventual recontagem.

As Organizações Globo, tão empenhadas em criticar a democracia venezuelana,  apoiaram o  Golpe de 1964, a Proconsult contra  Brizola em 1982 e foram contra a Campanha Diretas-Já, em 1984. E, ainda hoje, insistem em combater a instituição do voto impresso na urna eletrônica brasileira.

Povo ignorante?

Esses comentaristas da Globo tentam passar a imagem de que a Venezuela é um país de atraso cultural. Vamos aos fatos: enquanto a Venezuela já foi declarada oficialmente, pela UNESCO, como “Território Livre do Analfabetismo”, o Brasil ainda não tem meta segura para erradicar esta mazela social.

Lá, para a erradicação do analfabetismo, além da utilização de um método elaborado em Cuba, o “Yo Si Puedo”, houve  mobilização do governo, das massas, das instituições, mas também dos meios de comunicação públicos, que possuem  programação cultural educativa.

Também foram alfabetizados campesinos, índios, povo pobre na Venezuela, na Bolívia e no Equador. Em breve será a Nicarágua a ser declarada também, oficialmente, pela Unesco, Território Livre do Analfabetismo.

Vale lembrar que o programa Telecurso Segundo Grau, produzido pela Fundação Roberto Marinho, é exibido em horário da madrugada, apesar dos recursos públicos despendidos -  demonstração da baixa preocupação  em contribuir para a elevação do nível educacional e cultural do nosso povo.

O que é notícia?

A ALBA - Aliança Bolivariana para o Progresso - colocou o petróleo como instrumento  também do progresso social conjunto destes povos: milhares de latino-americanos estão recuperando a plena visão, por meio de cirurgias gratuitas realizadas pela Operación Milagro, um esforço comum entre Cuba e Venezuela. 

As cirurgias são feitas  em Cuba,  na Venezuela,  na Bolívia, no Equador, seja por médicos cubanos, ou locais. Isto não se informa, mas   tomei conhecimento, pelo Jornal Nacional,  de que a esposa do Príncipe Willians  está sofrendo muito enjoo na sua gravidez. Cuba e Venezuela decidiram operar 6 milhões de latino-americanos, gratuitamente, em 10 anos.

O que é notícia?

Índios leem “Cem anos de solidão”

Chávez, depois de erradicar o analfabetismo, criou a Universidade Bolivariana, pública e gratuita, a Universidade das Forças Armadas, e um programa para elevar a taxa de leitura do povo venezuelano. Por meio deste programa foram editados “Dom Quixote”, com 1 milhão de exemplares distribuídos gratuitamente, e “Contos”, de Machado de Assis, com 300 mil exemplares, tiragem que o genial escritor jamais mereceu aqui no Brasil, onde o analfabetismo persiste e a tiragem padrão arrasta-se na marca de 3 mil exemplares. 

Além disso, algumas tribos indígenas da Amazônia venezuelana já tiveram seu idioma sistematizado e, como primeira obra publicada, tiveram o belíssimo “Cem Anos de Solidão”, de Gabriel Garcia Marquez. No entanto, para estes comentaristas da Globo, na Venezuela há um “povo ignorante”, dirigido por um “ditador”...

Petróleo a preço de água

Antes de Chávez, quando 80 por cento dos venezuelanos viviam na miséria absoluta, o petróleo era regalado aos EUA, enquanto a burguesia local era conhecida por ser consumidora de champanhe e pela elevadíssima importação de caviar. 

Eleito, Chávez cumpriu promessa de campanha. Recuperou gradativamente o controle sobre a PDVSA e  fez uma cruzada para acordar a OPEP de seu sonho colonizado. Na época, o preço do petróleo estava em 7 dólares o barril,  e hoje avança pela casa dos 100 dólares. Eis a razão do ódio dos EUA a Chávez.

Evita Perón e Vargas

Este ódio imperial se expressa como uma sentença de morte contra qualquer mandatário que não seja talhado para vassalagem.  Quando Evita Perón foi acometida por um câncer, este jornalismo mortífero se expressou sem qualquer escrúpulo. O ódio saltou das páginas da imprensa portenha para os muros de Buenos Aires: “Viva el Câncer!”. 

Depois foi contra Getúlio Vargas, quando sua saída da vida foi comemorada em círculos manipulados pelo capital externo, que não suportavam a criação da estatal Petrobrás, dos direitos laborais inscritos na CLT e da lei da remessa de lucros ao exterior. Não por acaso, o povo expressou sua tristeza e sua fúria contra a Tribuna da Imprensa, O Globo, e até mesmo o jornal do PCB, Tribuna Popular. 

O Levante de 4 de Fevereiro de 1992

Processos revolucionários começam normalmente com rupturas da legalidade instituída quando esta acoberta iniquidades. A partir das revoluções outra legalidade é constituída. Assim foi a Revolução de 30, a Revolução Francesa,  a revolução em Cuba, na Nicarágua ou na Argélia. 

A Revolução Bolivariana começa com um levante insurrecional - o 4 de fevereiro de 1992 - destinado a convocar uma Assembleia Nacional Constituinte, cujo objetivo era retirar a Venezuela da condição de colônia petroleira. Na prisão, Chávez se transforma no homem capaz de traduzir e promover a identidade de seu povo com a sua história, com Bolívar, com sua mestiçagem negra e índia.

A Revolução Bolivariana começa com um levante armado e transforma-se em processo institucional por meio do voto popular. Mas, diante das constantes ameaças golpistas, Chávez mesmo declarou que “esta é uma revolução pacífica, pero armada”.

Jornalismo de desintegração

As lições de Chávez estão aí, mesmo que esta mídia golpista queira ocultar. A parceria Brasil-Venezuela multiplicou em mais de 500 por cento o comércio bilateral e hoje muitas empresas brasileiras realizam obras para  seu desenvolvimento, o que sempre foi sabotado pelas oligarquias do período pré-Chávez. 

Os comentaristas da Globo não informam nada disso, até porque apoiaram quando o Brasil, na era da privataria neoliberal, demoliu um terço de suas ferrovias, além de ter destruído sua indústria naval, que agora, recuperada, tem inclusive 27 encomendas para a construção de navios petroleiros da PDVSA, a serem feitos aqui.

Solidão do uniforme

Chávez recupera uma nova função social para os militares,  unindo-os ao povo e às causas mais preciosas para viver com dignidade, soberania  democracia e justiça social. Hoje os militares venezuelanos resgatam  correntes militares progressistas na história e seus representantes como Velasco Alvarado, Torres, Torrijos, Perón, Prestes, Nasser, Tito, a Revolução dos Cravos... São lições de Chávez.

Os comunicadores alardeiam desabastecimento alimentar, quando a Unicef comprova que a Venezuela teve reduzida drasticamente a desnutrição e sua mortalidade infantil.

Segundo estatísticas da FAO, o consumo de alimentos na Venezuela aumentou em 96 por cento no período de 2001 a 2011, Era Chávez, enquanto a Cepal atesta que este país é hoje o menos desigual da América Latina, além de pagar o maior salário mínimo do continente, o equivalente a 2440 reais, informação que a Globo jamais noticiará.

MST, sem veneno

Antes de Chávez, todo alimento era importado, até alface vinha de avião de Miami. Hoje o país já tem uma pecuária leiteira, já produz metade do arroz que consome e recebeu até a solidariedade do MST que lhe doou toneladas de sementes criollas de soja não transgênica.

Jornais populares e diversidade

Essas são algumas das generosas lições de Chávez, atacado pela Globo daqui, como pela de lá, exatamente porque existe plena liberdade de imprensa na Venezuela. Vale contar episódio de jornalista brasileira que  contou: “pedi ao jornaleiro imprensa de oposição ao Chávez. Ele apontou para toda a sua banca e disse-me: - minha filha, isso aí tudo é contra o governo.” 


Caminhando e cantando e seguindo a lição....

Que Chávez possa se recuperar, concluir a sua obra, na qual está a meta de construir e entregar 380 mil novas moradias em 2013, equipadas com móveis e eletrodomésticos, em terrenos localizados também em bairros nobres, e não numa periferia longínqua ou à beira de precipícios que desmoronam com as chuvas.

Quanto a nós, que aprendamos algumas destas lições, especialmente quanto à necessidade de fortalecer um sistema público de comunicação, para que tenhamos a pluralidade e a diversidade informativas, e um jornalismo como construção de cidadania e de humanidade.


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