segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

A Injustiça contra Genoino

Miruna, filha de Genoino: “A grande mídia parecia sentir prazer em nos sufocar”

[Texto editado por NMM.]

Texto original, publicado em 19 de fevereiro de 2017:


José Genoino foi um político de esquerda respeitado por todo mundo, até mesmo pelos adversários. A partir de 1982, quando foi eleito deputado federal pelo PT pela primeira vez, Genoino se tornaria um dos mais brilhantes e habilidosos parlamentares que o Congresso já conheceu. Depois do mensalão, tudo mudou. Genoino, que jamais acumulara bens além da casa simples em que vive até hoje, em São Paulo, seria tratado como um pária, um ladrão, um corrupto. E sua família, assediada e perseguida por uma imprensa feroz e sádica em sua sanha antipetista. Nenhum dos repórteres que cobriam a Câmara no auge do petista como parlamentar foi capaz de defendê-lo da injustiça. “Esta atitude da imprensa magoou demais meu pai, porque ele não esperava este tratamento unilateral, sem espaço para a verdade”, diz Miruna. “Ele rememorava toda a luta na ditadura por uma imprensa livre, mas, quando precisou, foi achincalhado. Não respeitaram meus filhos, pareciam sentir prazer em nos sufocar. Muito triste ter vivido isso.”

A educadora, primogênita de Genoino, vai lançar, em março, o livro Felicidade Fechada, onde transmite a visão dos familiares do petista sobre uma das maiores injustiças da história recente do país. É uma obra delicada, onde o olhar carinhoso da filha aparece em primeiro plano, sem lugar para rancor, mágoa ou vingança. “Nessa história, não vou falar de dados e informações. Não vou ficar explicando que meu pai é inocente, porque os empréstimos que ele assinou foram registrados na Justiça Eleitoral e já foram pagos pelo PT e aceitos pelo Tribunal de Justiça Eleitoral. Isso foi relatado e é verdade. Não vou dizer que não existiam provas que o condenassem. E vou tentar não ficar aqui soando como uma magoada, repetindo que o acontecido foi um tribunal de exceção. Não pretendo falar de tudo, porque quero contar a verdade desde dentro, desde quem viveu cada momento, desde quem cresceu sendo criada por um pai exemplar, que se tornou um avô iluminado e que jamais roubou nada de ninguém, nem deixou de seguir os princípios de justiça e igualdade que sempre o guiaram”, adverte, na introdução.

No livro aparecem poucos nomes. “Alguns nomes específicos ficaram fortes neste percurso? Sim. Mas não foram estes nomes que decidiram, foi um movimento grande. Foi a grande imprensa, foi a opinião pública, que acreditou, foi o STF como um todo, não um juiz. Nosso foco é no processo, como um todo, que foi injusto.”

“Meu livro não trata de vingança. Meu livro trata de vida, quer deixar um registro de que José Genoino é inocente. E isso é o mais importante, não as decepções.”

Um dos momentos mais tocantes é quando a família, reunida após um almoço descontraído com amigos, recebe, de repente, a notícia de que Genoino será preso.

Foi quando o telefone do meu pai tocou. Ele mudou sua expressão, foi falando e se levantando, e nós não conseguíamos falar. Ele desligou e disse: ‘Saiu o papel. Chegou a hora pessoal’ Com a mala pronta, esperando o advogado, meu pai foi para a cozinha e disse: ‘Vamos lá pessoal, é uma injustiça, mas eu estou forte, vamos lá, vamos começar logo com isso’. Meu pai não aguentava mais a tortura de esperar e mostrava que já que era para viver a injustiça, que começasse logo de uma vez.”

Para visitar Genoino na Papuda, tinham que vestir-se completamente de branco. “Desde que soube que isso era assim, pensei e busquei todo tipo de explicação para essa obrigatoriedade, e só penso em uma coisa: marcar as famílias. Marcar e humilhar as famílias com a mesma vestimenta que qualquer preso."

Causa indignação ler o relato de Miruna sobre a extrema agressividade de repórteres e fotógrafos no contato com a família do então deputado federal, e a forma como a imprensa se portou diante do problema de coração que ele teve durante o processo. “A maior ferida de todas é aquela causada por terem conseguido, mídia e pessoas covardes, colocar em dúvida a real condição de saúde do meu pai. Quem dera não tivéssemos que passar por juntas médicas, que olhavam meu pai como um enganador de sua própria condição de saúde.”

Pergunto a Miruna como é o estado de espírito de José Genoino hoje, fora da prisão, seu cotidiano…

– Ele também pretende escrever um livro?

– Meu pai se dedica a conversas sobre sua paixão, que é a política, e a sociedade democrática e justa. Está estudando, e está se dedicando muito à família, em especial aos netos, fazendo com eles o que não pôde fazer por mim e por meus irmãos por conta da política. E sim, quando chegar o momento meu pai vai falar, vai contar a sua verdade e sua história.

– Como vocês estão acompanhando a nova prisão de Zé Dirceu e a Lava-Jato?

– Nós sentimos muito esta prisão do Zé Dirceu. A Lava-Jato nos preocupa, e precisamos repensar esta relação mídia e justiça, pois quem é citado tem seu nome jogado nas manchetes, sua casa invadida, e isso é uma injustiça por si só, ser condenado antes de ser julgado com imparcialidade.

– Você diz no livro que aguarda Justiça. Que tipo de Justiça ainda poderia ser feita?


– Um novo julgamento deste processo todo. Que sejam analisadas as provas, e não os “achismos”, as situações de “ele deveria saber”. Que um dia se prove que meu pai nunca cometeu crime algum. Sua história não é de dinheiro, mas sim de luta por seus ideais, de forma democrática e humana.

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