Nelson M. Mendes
A famosa mística Helena Blavatsky foi uma vez inquirida por
um entrevistador sobre aquela ideia, divulgada em seus livros, de que Deus está presente em todas as coisas.
Queria o entrevistador saber se não era uma blasfêmia supor que Deus estivesse,
por exemplo, nas cinzas do charuto sobre a mesa.
A resposta de Blavatsky perdeu-se nas cinzas da memória. Mas
é óbvio que não se pode imaginar uma única infinitesimal partícula do Universo
(que grafamos em maiúscula, contrariando a tradição gramatical, por considerar
que trata-se de topônimo superior a todos os outros) em que não esteja presente
a única coisa que verdadeiramente existe.
Deus – é claro – está também na borra de café.
Mensagens superiores são vertidas por meios diversos: a
Astrologia, o Tarô, o I Ching... e a borra de café. Enquanto o homem não pode
Ver diretamente, ele se vale desses interessantíssimos espelhos, que refletem
verdades, previsões e advertências.
Mas as mensagem se revestem de símbolos. As metáforas, ao
contrário do que supõem certos intelectuais com pretensões de “isenção” e
“rigor científico”, não existem para ornamentar o texto: são recursos
valiosíssimos quando se trata de expressar coisas sutis e muitas vezes
indizíveis de outra forma. Metáforas foram
usadas por grandes pensadores: de Platão a Jung, do mais antigo sábio hindu ao contemporâneo astrofísico. (O que são
expressões como “buraco negro” ou “horizonte de eventos” senão metáforas?) Mesmo
os grandes instrutores da humanidade recorriam aos símbolos. Disse um conhecido
místico a seu grupo de seletos discípulos: “A vós é dado conhecer os mistérios do
reino de Deus; mas, para os que estão de fora, todas essas coisas se dizem por
parábolas.”
As parábolas, no caso de Jesus, eram uma forma de dizer sem
revelar. Há uma tradição milenar, presente em todas as religiões, cara a todos
os respeitáveis instrutores, de que certos saberes só podem ser explícita e
integralmente apresentados a quem estiver moral e intelectualmente preparado.
As parábolas e metáforas, no caso desses instrumentos em que
buscamos no visível o reflexo do invisível, são a própria linguagem possível através da qual eles nos falam. Diz Annie Besant
(aliás, discípula de Blavatsky): “O mito é infinitamente mais verdadeiro do que
a história.” Depois de fazer uma metáfora
relativa a corpos e suas sombras, Besant cita o antigo aforismo: “O que está em
cima é análogo ao que está embaixo.”
O que está nas estrelas está na borra de café. Porque o Todo
está em tudo.
E a borra fala – claro – na linguagem de todos os mestres e
oráculos.
Coube-me viver a experiência. Eu achei que iria apenas tomar
um turkish coffee; mas a leitura da
borra era o brinde especialíssimo. A intérprete
disse a princípio algumas coisas triviais; mas, em seguida, parecendo vagamente
surpresa e intrigada, falou: “Você tem um segredo – um segredo bom. Mas não
quer revelar porque acha que as pessoas não estão preparadas.”
Não entendi a que ela exatamente se referia; meu intelecto
não foi alimentado. Mas meu coração soube
imediatamente que ela dizia uma verdade.
Depois, ainda parecendo intrigada, ela disse: “Você tem uma
chave. Mas não sabe que porta abrir com essa chave.”
Mais uma vez, meu intelecto não absorveu uma informação; meu
coração, sim. E senti que a referência ao “segredo” estava de alguma forma
relacionada à da “chave”. Há um segredo a ser revelado. Uma porta a ser aberta.
Meu intelecto se cala. Mas meu coração acredita que este
simples relato já me aproxima da porta.
Um comentário:
Nelson, que lindo!!!! Sempre soube que a você estava reservado um propósito muito mais elevado.
Amo você.
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