quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Os pirralhos fascistas de Curitiba

 



Texto original:

https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Cartas-do-Mundo/Carta-de-Berlim-a-indigencia-e-a-idade-mental-dos-Lava-Jato/45/49909

 

Carta de Berlim:

a indigência e a idade mental dos Lava-Jato

 Por Flávio Aguiar

 11/02/2021 10:09

 

 

Texto editado / NMM:




Quando eu era criança, a maioria dos meus heróis provinha do cinema: Buffalo Bill, Roy Rogers, atores como Gary Cooper, Burt Lancaster, John Wayne, Kirk Douglas, Victor Mature, Humphrey Bogart, Peter Cushing, etc.

Havia heróis também que vinham da literatura: Tarzan, Sherlock Holmes entre eles. E vinha gente dos quadrinhos, como de novo Roy Rogers, o Zorro, o Cavaleiro Negro, Jim das Selvas… Super-heróis? Poucos: lembro-me do Capitão Marvel e do Capitão América.

Havia os nacionais: Pedrinho, do Sítio do Pica-Pau Amarelo, o Anjo, Jerônimo; no cinema Anselmo Duarte e John Herbert. Minha infância foi povoada de heróis e de heroísmo.

Depois eu fui crescendo. Continuei a ter heróis no meu panteão imaginário. Mudaram um pouco de caráter: Garibaldi se misturou entre eles. Quando explodiu nos quadrinhos e no cinema a geração multiplicada dos super-heróis e super-heroínas eu já crescera um bocado. Meus preferidos eram o Homem Aranha e o atormentado Surfista Prateado. Eu oscilava assim para o universo dos anti-heróis ou heróis paralelos. Para mim foi um sinal de maturidade.

Por isto mesmo, recentemente fiquei algo espantado ao deparar com a foto acima, que registra o conjunto dos procuradores da Operação Lava-Jato. Nela não comparece seu líder, mentor, inspirador, instrutor, o ex-juiz Sérgio Moro, agora comprovadamente teleguiado, bem como os procuradores, por “forças ocultas” desde Washington, Nova Iorque e outras cidades.

Desde sempre desconfiei daquela turma, que boa coisa não iam fazer no nosso país. O que logo me despertou essa desconfiança foi o empuxo favorável que lhes deu nossa mídia mainstream, sempre tão ávida por heróis que a ajudassem a desarticular a ação das esquerdas, em particular a petista, nas últimas décadas. Foi assim com seu primeiro herói judiciário, o fatídico e hoje desaparecido Joaquim Barbosa.

Quando a Operação Lava-Jato investiu contra a Petrobras, que acabara de chegar ao fabuloso pré-sal, a ficha começou a cair. Não caiu sozinha. Um amigo advertiu que aí deveria ter o dedo de agências norte-americanas, como o FBI, a CIA, a National Security Agency e de organismos quejandos terceirizados. Ao longo do tempo, não deu outra: a advertência do meu amigo se comprovou profética.

À medida que a e os Lava-Jato galgavam os degraus do sucesso, mais horrorizado eu ficava, até mesmo porque eu via como eram recebidos por grande parte da mídia mainstrem mundial, nos Estados Unidos e na Europa, também interessada em desarticular o mundo das esquerdas latino-americanas.

O pináculo daquela recepção triunfal foi o comparecimento do procurador Deltan Dallagnol, o mesmo que posa à frente da tropa de procuradores formada naquela foto, para receber, em Berlim, o Prêmio Anti-Corrupção 2016 da Transparency International, hoje suspeita por seus critérios não parecerem tão criteriosos como deveriam ser.

O então juiz Moro pontificava em encontros universitários, inclusive aqui na Alemanha, ungido sacrossanto herói anti-corrupção. Foi recebido com tapete vermelho pelo Instituto de Sociologia Max Weber da Universidade de Heidelberg.

Na época, protestamos junto ao Instituto Max Weber. Houve também protestos in loco.

Seu Grande Irmão do Norte nele sempre mandou e desmandou: um fantoche perfeito. De quebra, ajudou a quebrar a economia brasileira e abriu caminho para o Anjo da Morte que ocupa o Palácio do Planalto, tudo com ajuda daquela meninada de Curitiba.

Meninada? Pois é. Esta foi outra ficha que me caiu, enquanto eu lia as primeiras mensagens por eles trocadas, nas reportagens da Vaza-Jato, no The Intercept. Eles - e havia também elas - se achavam inatacáveis, invulneráveis e até, arrisco dizer, invisíveis e inaudíveis, logo neste século em que tudo é escutável, registrável, em que não é mais possível guardar segredos - pelo menos para quem usar um computador ou um celular de qualquer tipo.

Em muitas de suas brincadeiras, as crianças podem se tornar muito cruéis, pois ainda não sabem medir nem controlar a força que são capazes de ter. Os Lava-Jatos, adultos, sabem a força que têm; mas se comprazem em atormentar e manifestar desprezo pelos “objetos” que examinam, acusam e pré-julgam. Moro não age de modo diferente, embora tenha um estilo algo distinto: é igualmente tosco nos seus pensamentos, mas é menos espalhafatoso, embora seja tão cruel quanto a rapaziada que monitorava, industriava. dirigia e liderava.

Vejam bem: ele não está naquela foto. Para mim ela foi muito reveladora. Dallagnol acabou de entrar na casa dos quarenta anos; cresceu exatamente quando a febre dos super-heróis explodia no cinema e na televisão. A primeira coisa que me veio à mente foi outra foto, aquela em preto-e-branco, d’Os Intocáveis, a série de televisão estreada em 1959 e que entrou pelos anos sessenta a dentro. A semelhança é muito grande; pois se os “intocáveis” de Curitiba não portam armas na sua foto, eles se comportam como se as tivessem.

Mas fui adiante. O modelo narrativo que os burladores da justiça, sediados em Curitiba, quiseram impor para si mesmos, e para o mundo, remete ao universo dos super-heróis, dotados de super-poderes. Isto me mostrou que, ao lado dos ensebados e sebosos leões-de-chácara do campo de concentração em que estão querendo transformar o Brasil, há aqueles que simplesmente não cresceram mental nem emocionalmente. Continuam a agir como adolescentes encantados pela auto-imagem arrogante e narcisista que construíram para si mesmos, e que os torna de fato invulneráveis - não aos olhares externos, e sim aos sentimentos humanos mais comezinhos, como a compaixão e a solidariedade para com terceiros.

No seu mundo não há “terceiros” com forma humana, somente inimigos. E só reconhecem solidariede em relação à confraria espúria que criaram.

Embora ajam com desenvoltura e até esperteza, tornaram-se verdadeiros “mentecaptos”, na acepção profunda da palavra. Tiveram a mente capturada pela auto-imagem que forjaram para explicar suas atitudes arbitrárias, cruéis, violentas, colocando-os com a sensação de estarem acima do bem e do mal, e do comum dos mortais. São os seus próprios super-heróis, tudo podem, a si tudo consentem: amputaram de suas almas o largo e brumoso oceano dos “sentimentos do mundo”, fechando-se em seus casulos, onde, acreditam, são belas crisálidas desabrochando em borboletas. Quando, na verdade, se transformaram em horríveis vermes devoradores de carniça: sobretudo a própria.

No filme “Sitting Bull”, depois de aniquilar o 7o. Regimento de Cavalaria, comandado pelo Custer, o grande chefe Touro Sentado recebe um jovem oficial da cavalaria norte-americana. Diz ele: “Quando os brancos ganham uma batalha, eles chamam de vitória; quando nós ganhamos, eles chamam de massacre”. Nunca mais consegui torcer pela cavalaria americana. Acho que os “boys” de Curitiba nunca viram este filme. Se vissem, não gostariam.

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