terça-feira, 18 de junho de 2024

A verdade sobre a corrupção




Nelson M. Mendes

A grande mídia, ao mesmo tempo em que costuma “passar pano” para ladrões de joias, golpistas e famílias que compram 51 imóveis com dinheiro vivo, adora fazer acusações de corrupção política. Principalmente contra políticos que, de um modo ou outro, pensam no povo. Disso foram vítimas Getúlio, Jango, Brizola, Lula, Dilma... e muitos outros. (Nenhuma acusação é provada. Hoje, o mundo sabe que Dilma sofreu um golpe; e até a ONU reconheceu que Lula foi vítima de uma das maiores fraudes jurídicas da história mundial.)

Mas a mídia pouco ou nada fala da corrupção no mundo corporativo. Por que será? Será porque a mídia representa o mundo corporativo, faz parte do mundo corporativo?

Em artigo do saudoso jornalista Pedro Porfírio, de 2011, está registrado que o diretor de um centro de pesquisa estadunidense, Raymond Baker, estimou que o dinheiro desviado (roubado) no mundo chegava a US$ 2 trilhões (suponho que anualmente); destes, cerca de 32% cabiam ao crime organizado, 65% a manobras empresariais ilícitas... e apenas 3% à corrupção política. Hoje, a roubalheira deve passar de dois trilhões de dólares; e a participação dos meios empresarial e financeiro deve ter até aumentado, em paralelo ao aumento progressivo da concentração de renda e riqueza.

Porfírio cita texto que Baker escreveu em 2005, e que segue abaixo editado:

Ao longo das quatro últimas décadas, foi sendo aperfeiçoada uma estrutura que facilita as transações financeiras internacionais ilegais. Essa estrutura de ‘dinheiro sujo’ consiste em paraísos fiscais, empresas de fachada, contas secretas, propinas e brechas nas leis dos países ocidentais que encorajam a entrada de dinheiro criminoso e decorrente da sonegação de impostos. Hoje, aproximadamente metade do comércio entre países envolve gerar, transferir e ocultar dinheiro ilegal. Muitas multinacionais e bancos internacionais fazem uso rotineiro dessa estrutura, ignorando a legislação contra a lavagem de dinheiro.

Porfírio reproduz também as palavras de John Christersen, do Secretariado Internacional da Rede pela Justiça Fiscal, e que seguem também editadas:

A sonegação de impostos corrompe os sistemas fiscais do Estado moderno e solapa a capacidade de prover serviços. Isso priva a sociedade de recursos públicos legítimos. Entre os sonegadores estão instituições e indivíduos que se consideram uma elite separada da sociedade.

O jornalista e professor da FACAMP, Carlos Drummond, também é citado, em passagem aqui igualmente editada:

Longe de ser atributo apenas de algumas pequenas corretoras, escritórios de doleiros e de comerciantes e industriais que se envolvem com sonegação, contrabando e mercado negro, a transgressão disseminou-se a ponto de estar presente hoje em grande parte das transações entre empresas. Fraudes, roubos, irregularidades contábeis, crimes tributários e outras transgressões cometidas por grandes empresas de renome mundial provocaram perdas para milhões de contribuintes, consumidores, aposentados e pequenos acionistas.

O blog Satyagraha apresenta, em 2017, uma edição da entrevista que o sociólogo Jessé Souza concedeu ao jornal Zero Hora. Nela, ele diz que o brasileiro é doutrinado, tanto pela mídia quanto por respeitados intelectuais, a acreditar que herdamos de Portugal a “tendência à desonestidade e à corrupção [...] e que ela está na política e no Estado”. Explica que essa falsa versão “garante a invisibilidade para a real corrupção, que nos dias de hoje é a montada pelo mercado, pelos oligopólios e atravessadores”. Diz ainda que “os políticos [...] não são os chefes, eles ficam é com as sobras”. (Os 3% a que se referiu Baker...) Jessé não poupa palavras para falar do projeto da classe dominante brasileira: “Nossa elite é tão saqueadora, abusiva e rapineira como a elite de uma sociedade escravocrata. [...] E essa elite montou uma relação de convencimento com a classe média. Para os pobres a gente passa o pau, manda a polícia. A classe média a gente convence.”

Em nova entrevista, em 2018, também editada pelo blog Satyagraha, Jessé Souza volta ao assunto da “verdadeira corrupção”, desta vez incluindo o Banco Central (veja gráfico aqui):

A Lava a Jato prendeu meia-dúzia e deixou invisível o saque real trilionário de uma elite proprietária e uma alta classe média. O foco na corrupção política invisibilizou os juros extorsivos embutidos nos preços, a estarrecedora exploração do rentismo e a corrupção legalizada dos donos do mercado. A boca de fumo da corrupção está no Banco Central [...] Mas as classes exploradas economicamente acreditam na balela: ficamos mais pobres por conta do roubo dos políticos. [...] nós todos pagamos juros que vão para o bolso de quem? Esse assalto econômico não é visto como corrupção.

O blog Satyagraha editou ainda uma conferência de Jessé Souza em Paris, em 2019. Reproduzimos aqui duas significativas passagens do texto:

Depois de 5 anos, a Lava a Jato recuperou 1 bilhão de dólares para os cofres públicos. Ora, somente a sonegação de impostos representa 520 bilhões de dólares.

Como posso fazer a classe média servir aos meus interesses? É preciso imbecilizá-la e fazê-la agir contra seus próprios interesses de classe. É preciso conquista-la pelas ideias.

Em resumo, a história da corrupção tem sido muito mal contada. O caso do triplex, que fez Lula ficar ilegalmente preso por 580 dias e não poder participar da eleição vencida pelo fascista Bolsonaro, foi inventado pelo jornal O Globo e abraçado pelo “juiz ladrão” Moro. No livro “Comentários a uma sentença anunciada”, 122 notáveis juristas escreveram artigos mostrando os crimes jurídicos que Moro cometeu para condenar Lula de qualquer jeito; e o filósofo e professor de Lógica Euclides Mance escreveu livro apresentando as 10 “falácias” engendradas por Moro com o mesmo objetivo. (Lula sofreu, no total, 26 processos – todos fraudulentos; e superou todos. Mas até hoje tem gente que acredita naquela imagem do “Lula ladrão”, criada pela mídia inimiga do povo brasileiro.)

E por que a mídia inventa mentiras sobre políticos ditos “progressistas”, ou ligeiramente “de esquerda”? Exatamente porque esses políticos querem o bem do povo. De Gandhi a Mandela, de Brizola a Lula... A grande mídia representa o poder econômico estabelecido, o capital transnacional, que não quer perder um centavo do dinheiro acumulado e parado, sem gerar qualquer benefício social. Pelo contrário: a ânsia do capital é multiplicar-se incontrolavelmente, como as células de um câncer. Para isso, conta não só com a mídia, mas também com políticos como Bolsonaro e Milei, que está destruindo a Argentina.

Lula lembrava recentemente que 3 mil pessoas, no mundo, (um décimo da população de Santa Rosa, em Niterói!) têm 15 trilhões de dólares. É a favor desses e de outros bilionários que a grande mídia trabalha. E a classe média compra as mentiras e as propaga avidamente nas redes sociais.

O saudoso jornalista Fritz Utzeri tinha razão: a classe média adora defender ideias contrárias a seus interesses; e aos da maioria do povo. 

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