Nelson M. Mendes
A grande mídia, ao mesmo tempo
em que costuma “passar pano” para ladrões de joias, golpistas e famílias que
compram 51 imóveis com dinheiro vivo, adora fazer acusações de corrupção
política. Principalmente contra políticos que, de um modo ou outro, pensam no
povo. Disso foram vítimas Getúlio, Jango, Brizola, Lula, Dilma... e muitos
outros. (Nenhuma acusação é provada. Hoje, o mundo sabe que Dilma sofreu um
golpe; e até a ONU reconheceu que Lula foi vítima de uma das maiores fraudes
jurídicas da história mundial.)
Mas a mídia pouco ou nada fala
da corrupção no mundo corporativo. Por que será? Será porque a mídia representa
o mundo corporativo, faz parte do mundo corporativo?
Em artigo do saudoso jornalista Pedro Porfírio, de 2011, está registrado que o diretor de um centro de pesquisa estadunidense,
Raymond Baker, estimou que o dinheiro
desviado (roubado) no mundo chegava a US$ 2 trilhões (suponho que anualmente);
destes, cerca de 32% cabiam ao crime organizado, 65% a manobras empresariais
ilícitas... e apenas 3% à corrupção política. Hoje, a roubalheira deve passar
de dois trilhões de dólares; e a participação dos meios empresarial e
financeiro deve ter até aumentado, em paralelo ao aumento progressivo da
concentração de renda e riqueza.
Porfírio cita texto que Baker
escreveu em 2005, e que segue abaixo editado:
Ao longo das quatro últimas décadas, foi sendo aperfeiçoada uma
estrutura que facilita as transações financeiras internacionais ilegais. Essa
estrutura de ‘dinheiro sujo’ consiste em paraísos fiscais, empresas de fachada,
contas secretas, propinas e brechas nas leis dos países ocidentais que encorajam
a entrada de dinheiro criminoso e decorrente da sonegação de impostos. Hoje,
aproximadamente metade do comércio entre países envolve gerar, transferir e
ocultar dinheiro ilegal. Muitas multinacionais e bancos internacionais fazem
uso rotineiro dessa estrutura, ignorando a legislação contra a lavagem de
dinheiro.
Porfírio reproduz também as
palavras de John Christersen, do Secretariado Internacional da Rede pela
Justiça Fiscal, e que seguem também editadas:
A sonegação de impostos corrompe os sistemas fiscais do Estado moderno e
solapa a capacidade de prover serviços. Isso priva a sociedade de recursos
públicos legítimos. Entre os sonegadores estão instituições e indivíduos que se
consideram uma elite separada da sociedade.
O jornalista e professor da
FACAMP, Carlos Drummond, também é citado, em passagem aqui igualmente editada:
Longe de ser atributo apenas de algumas pequenas corretoras, escritórios de doleiros e de comerciantes e industriais que se envolvem com
sonegação, contrabando e mercado negro, a transgressão disseminou-se a ponto de
estar presente hoje em grande parte das transações entre empresas. Fraudes,
roubos, irregularidades contábeis, crimes tributários e outras transgressões
cometidas por grandes empresas de renome mundial provocaram perdas para milhões
de contribuintes, consumidores, aposentados e pequenos acionistas.
O blog Satyagraha apresenta, em
2017, uma edição da entrevista que o sociólogo Jessé Souza concedeu ao jornal
Zero Hora. Nela, ele diz que o brasileiro é doutrinado, tanto pela mídia quanto
por respeitados intelectuais, a acreditar que herdamos de Portugal a “tendência
à desonestidade e à corrupção [...] e que ela está na política e no Estado”. Explica
que essa falsa versão “garante a invisibilidade para a real corrupção,
que nos dias de hoje é a montada pelo mercado, pelos oligopólios e
atravessadores”. Diz ainda que “os políticos [...] não são os chefes, eles
ficam é com as sobras”. (Os 3% a que se referiu Baker...) Jessé não poupa
palavras para falar do projeto da classe dominante brasileira: “Nossa elite é
tão saqueadora, abusiva e rapineira como a elite de uma sociedade escravocrata.
[...] E essa elite montou uma relação de convencimento com a classe média. Para
os pobres a gente passa o pau, manda a polícia. A classe média a gente
convence.”
Em nova entrevista, em 2018,
também editada pelo blog Satyagraha, Jessé Souza volta ao assunto da
“verdadeira corrupção”, desta vez incluindo o Banco Central (veja gráfico aqui):
A Lava a Jato prendeu meia-dúzia e deixou invisível o saque real
trilionário de uma elite proprietária e uma alta classe média. O foco na
corrupção política invisibilizou os juros extorsivos embutidos nos preços, a
estarrecedora exploração do rentismo e a corrupção legalizada dos donos do
mercado. A boca de fumo da corrupção está no Banco Central [...] Mas as classes
exploradas economicamente acreditam na balela: ficamos mais pobres por conta do
roubo dos políticos. [...] nós todos pagamos juros que vão para o bolso de
quem? Esse assalto econômico não é visto como corrupção.
O blog Satyagraha editou ainda
uma conferência de Jessé Souza em Paris, em 2019. Reproduzimos aqui duas
significativas passagens do texto:
Depois de 5 anos, a Lava a Jato recuperou 1 bilhão de dólares para os
cofres públicos. Ora, somente a sonegação de impostos representa 520 bilhões de
dólares.
Como posso fazer a classe média servir aos meus interesses? É preciso
imbecilizá-la e fazê-la agir contra seus próprios interesses de classe. É
preciso conquista-la pelas ideias.
Em resumo, a história da
corrupção tem sido muito mal contada. O caso do triplex, que fez Lula ficar
ilegalmente preso por 580 dias e não poder participar da eleição vencida pelo
fascista Bolsonaro, foi inventado pelo jornal O Globo e abraçado pelo “juiz
ladrão” Moro. No livro “Comentários a uma sentença anunciada”, 122 notáveis
juristas escreveram artigos mostrando os crimes jurídicos que Moro cometeu para
condenar Lula de qualquer jeito; e o filósofo e professor de Lógica Euclides Mance escreveu livro apresentando as 10 “falácias” engendradas por Moro com o
mesmo objetivo. (Lula sofreu, no total, 26 processos – todos fraudulentos; e
superou todos. Mas até hoje tem gente que acredita naquela imagem do “Lula
ladrão”, criada pela mídia inimiga do povo brasileiro.)
E por que a mídia inventa mentiras
sobre políticos ditos “progressistas”, ou ligeiramente “de esquerda”?
Exatamente porque esses políticos querem o bem do povo. De Gandhi a Mandela, de
Brizola a Lula... A grande mídia representa o poder econômico estabelecido, o
capital transnacional, que não quer perder um centavo do dinheiro acumulado e
parado, sem gerar qualquer benefício social. Pelo contrário: a ânsia do capital
é multiplicar-se incontrolavelmente, como as células de um câncer. Para isso,
conta não só com a mídia, mas também com políticos como Bolsonaro e Milei, que
está destruindo a Argentina.
Lula lembrava recentemente que 3
mil pessoas, no mundo, (um décimo da população de Santa Rosa, em Niterói!) têm
15 trilhões de dólares. É a favor desses e de outros bilionários que a grande
mídia trabalha. E a classe média compra as mentiras e as propaga
avidamente nas redes sociais.
O saudoso jornalista Fritz Utzeri tinha razão: a classe média adora defender ideias contrárias a seus interesses; e aos da maioria do povo.
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