Nelson M. Mendes
Apresentação
Sei que você prefere textos superficiais
e resumidos. Assim como prefere um hambúrguer a um prato balanceado.
Mas recomendamos que leia todo o texto. Ele
é fruto de muita análise da cena sociopolítica brasileira (que não é
essencialmente distinta da mundial), principalmente através de seu reflexo nas
redes sociais, e enriquecida por observações feitas por respeitados
intelectuais.
Se você quiser pesquisar mais ainda, não
deixe de visitar os links espalhados pelo caminho. Alguns remetem a trabalhos
deste honesto e esforçado escriba, que batizou seu blog como Satyagraha,
que significa ‘apreço pela verdade’. Mas há também artigos de notáveis
jornalistas, sociólogos, economistas. Haverá talvez (não sei ainda exatamente
para onde me levará esse rio) referência a algum grande jurista – porque muito
necessários nesses tempos de fraudes e mentiras.
Comecemos por discutir o título do texto.
O dicionário do Aurélio explica que metástase vem do grego metástasis,
‘mudança de lugar’. O termo tem algumas acepções que eu ignorava; mas a que nos
interessa é aquela que tem em Medicina: disseminação de um câncer pelo
organismo, a partir de seu foco inicial. Quando o médico diz que há metástase,
o paciente sabe que a situação é terminal.
É exatamente a situação do Capitalismo,
que padece de uma espécie de câncer congênito. O bravo jornalista e político
Milton Temer escreveu no Facebook em 2011, a propósito de mais um dos chiliques
do sistema: “O simbólico em toda essa novela, sem dúvida, é mais uma
confirmação do prenúncio de Marx quanto ao Capitalismo carregar em sua essência
o germe de sua própria destruição.”
Explicada a primeira parte do título,
passemos a analisar a expressão (de minha própria lavra – confesso) pequeno-fascista.
A minha óbvia inspiração foi a expressão aparentada, pequeno-burguês. O pequeno-fascista
é aquele indivíduo ambicioso e iludido que espera alcançar um dia o pote de
ouro prometido pelo Capitalismo e, assim, oferece a própria vida para
defendê-lo
A verdade que dói, mas liberta
A crise
terminal do Capitalismo não é invenção deste observador. O prêmio Nobel de
Economia Joseph Stiglitz escrevia em
2011 que a crença em mercados livres só gerou concentração de renda, mesmo nos
países mais ricos. E que ninguém aprendeu com a crise de 2007/08. Disse ainda
que os EUA (o foco principal de sua crítica), em vez de cortar gastos com guerras e cobrar
impostos justos dos ricos, economizavam em investimentos sociais, remédio que já
se havia mostrado falho. Ainda assim – acrescentou Stiglitz – o sistema financeiro persistia no lobby pelo
afrouxamento ainda maior dos regulamentos financeiros. Segundo o economista,
esse seria o caminho para o abismo.
Stiglitz sugere medidas para ‘salvar’ o
Capitalismo. Na opinião deste e de muitos outros observadores, entretanto, não
adiantam medidas paliativas, remendos de ocasião. O Capitalismo é há muito
tempo mantido vivo por aparelhos. Segundo escreveu o jornalista e
ambientalista George Monbiot em meados de 2019, o problema não está no tipo
de capitalismo – mas no Capitalismo em si, um sistema socialmente injusto e
ambientalmente predatório.
Mesmo este escriba aprendiz e filósofo
amador vem há anos, nas redes sociais, repetindo a mensagem apocalíptica: “O
fim está próximo.” Com essa frase, aliás, ele começou o ensaio de 2019 A burrice do fim do mundo; mas esclareceu em seguida: “Não, não seremos
salvos pelo meteoro; ou aniquilados pelo meio-ambiente vingador. (Observem que salvação
e aniquilação têm o mesmo sentido.) Tudo isso deverá acontecer em algum
momento. Antes, porém, a ordem mundial, predominantemente capitalista, deverá
morrer devorando as próprias entranhas.”
Em 2018, no texto A Tulipa Podre,
ele já havia abordado o assunto de forma mais extensa, fazendo inclusive uma
contextualização histórica para mostrar que a patologia autoimune do
Capitalismo já se manifestara em seus tempos de embrião, lá pelo começo do
século XVII.
O Capitalismo, pois, vem aos tropeços e
soluços desde o nascimento. Em 1929, a crise foi quase fatal. O Liberalismo (a indumentária
institucional do Capitalismo) fracassara rotundamente. A Grande
Depressão provocou miséria e suicídios. Então, conhecidos próceres do
Liberalismo, como Mises, Friedman e Hayek, reuniram-se às pressas em Paris, em
1938, para forjar a nova teoria econômica que garantiria sobrevida ao
cambaleante Capitalismo. Surgiu então uma doutrina econômica de proveta,
artificial: o Neoliberalismo... Pela nova doutrina – vejam só – o Estado era
chamado a intervir; porém a favor do Mercado.
Em A burrice do fim do mundo,
escrevi: “Quando um organismo entra em falência, ele começa a devorar-se a
partir da periferia, para preservar os órgãos essenciais. Na ordem mundial
capitalista, a periferia somos nós, o terceiro mundo.”
A tradição é que os países mais fortes sangrem
ou devorem os mais fracos.
Parece ao leitor linguagem muito crua e simplória?
Bem este é o país em que as pessoas acreditam em mamadeira erótica, kit-gay,
Friboi do Lulinha e muitas outras fake news; o país em que, segundo ouviu um
médico amigo num congresso, 50% da população têm deficiências cognitivas
resultantes da desnutrição na primeira infância... É por isso, aliás, que é tão
fácil manipular o público, segundo o sociólogo Jessé de Souza: “Ele é tornado
imbecil pela mídia comprada direta ou indiretamente para fazer esse papel. Para
você apoiar a destruição do Estado via captura do orçamento para o rentismo e a
privatização dos serviços que o Estado presta, você tem que ser rico ou
otário.”
O economista Pedro Rossi (nem todo
economista é mercenário a soldo do Capital Transnacional), dizia, em entrevista
de 2017, basicamente o seguinte: há uma crença fundamentalista de que o Estado
atrapalha o crescimento. Isso é totalmente falso; e já se busca um
pós-capitalismo, com a ressignificação do Estado. Sob o Neoliberalismo, a
desigualdade é vista como natural – e só cresceu no Brasil e no mundo. A
continuidade de políticas neoliberais exigiu um golpe e vai exigir um futuro
governo autoritário. (O economista estava sendo profético!) Finalmente, Rossi
pontificou: “Neoliberalismo e Democracia são incompatíveis.”
De fato, sabe-se que não há caso na
História de pais que tenha realmente se desenvolvido sem a interferência
direta do Estado. Não é preciso mencionar as potências europeias a partir das
grandes navegações; não é preciso retroceder até Roma, ou mais ainda. Basta
recordar o que aconteceu ainda ontem, quando da devastadora crise de
1929, mencionada acima. Causada pelo Mercado, foi em parte solucionada
pelo Estado: o presidente Roosevelt, com o New Deal, soergueu o
país – antes mesmo que os teóricos do Neoliberalismo decretassem que o Estado
deveria, sim, atuar para ajudar o Mercado, principalmente quando ele se machucasse
com suas irresponsáveis travessuras. Em seguida, os EUA experimentariam outro
grande impulso ao seu desenvolvimento: a Segunda Guerra, quando a indústria do
país foi chamada a participar do “esforço de guerra”. Produzir armas é um
grande negócio.
A ideia de incompatibilidade entre
Democracia e Neoliberalismo pode soar a muitos iludidos como horrenda heresia; mas
é só afastar um pouco a cortina de tradicionais mentiras midiáticas – e
acadêmicas! – , para vermos o que se esconde nos bastidores.
Na verdade, o Neoliberalismo cresceu na
estufa do Fascismo. O Grande Capital via no Fascismo uma proteção contra o
‘comunismo’ (um sistema que jamais existiu de fato no mundo, conforme você
aprendeu no link acima). Por isso, grandes corporações e bancos financiaram o
nazifascismo. O ícone neoliberal Friedich Hayek apoiou explicitamente Hitler; e
seu par Ludwig von Mises não só foi conselheiro econômico do governo fascista
de Engelbert Dollfuss, na Áustria, como disse que o nazifascismo “salvou a
civilização europeia”.
Mussolini tinha neoliberais de carteirinha
no seu ministério. “Queremos retirar do Estado todos os seus poderes
econômicos. Basta de ferroviários estatais, carteiros estatais, seguradores
estatais. Basta deste Estado mantido à custa dos contribuintes e pondo em risco
as exauridas finanças do Estado italiano.” Quem disse isso foi o próprio
Mussolini, em discurso de 1922. Foi Mussolini que inventou as
privatizações!
Os pequenos-fascistas gostam de
considerar o Nazismo “de esquerda” porque a doutrina de nefasta memória e
persistente presença não pode, obviamente, ser “coisa direita”. O próprio Hitler
se irritava com a associação do Nazismo ao Socialismo; mas há hoje legiões de
zumbis brasileiros dispostos a discutir isso até com especialistas alemães... Embora,
por uma questão de obediência cultural, esses zumbis não consigam deixar
de condenar o Nazismo stricto-sensu, aquele que matou milhões, etc., no
fundo de suas alminhas pequenas são fascistas perfeitos: pequenos-fascistas. Eles
farão qualquer coisa para evitar mudanças. Exatamente como gosta o Grande
Capital. Que o mundo continue obscenamente desigual – mas livre do ‘Comunismo’.
Ser “de esquerda” é o pior dos crimes. Embora “ser de esquerda” signifique
apenas pensar no outro. Como fizeram Gandhi, Luther King, Mandela, Jesus
Cristo...
O pequeno-fascista tem “a fé fundamentalista
de que, pela varinha de condão da Meritocracia, jogando o jogo de cartas
marcadas do Capitalismo”, conseguirá um dia participar do banquete de que só
recebe migalhas; por isso ele rejeita o pobre, os líderes populares, e “se
identifica” com mafiosos como Eduardo Cunha, o qual, segundo faixa carregada
por multidão de imbecis há poucos anos, “é corrupto, mas está do nosso lado”. O
pequeno-fascista luta pela preservação do sistema que o oprime, e foi ensinado
a demonizar a ideia de esquerda – que, entretanto, é apenas uma espécie de
versão, no universo sociopolítico, da reação que corresponde a cada ação,
segundo a terceira lei de Newton. Ele foi doutrinado também a considerar a “corrupção”
o grande mal, de modo a não ver que o grande problema é a desigualdade
socioeconômica. “Ora, o Brasil tem problemas muito mais sérios – a começar por
políticas em que os interesses brasileiros são colocados abaixo de interesses
externos; os interesses do povo, abaixo dos interesses das elites; os
interesses do Trabalho, muito abaixo dos interesses do Capital.”
Platão dizia que as “desonestidades e
canalhices da espécie humana” renascem sob qualquer regime, como as “cabeças de
uma hidra”. Mas deixemos de lado o ceticismo do velho filósofo. A própria
Democracia, essa deusa grega (há quem diga que é mais antiga), cegamente
venerada até hoje, não está conseguindo controlar o espírito animal do
homem; até porque (sei que você vai ficar chocado – mas a verdade liberta) os
operadores econômicos são explicitamente estimulados, nos manuais do
Neoliberalismo, a desenvolverem esse espírito animal. Por isso, um
pensador do nosso tempo, Jean Ziegler, diz que “a democracia representativa
está esgotada”. Ziegler descreve um filme que todo mundo conhece: em
todo o mundo há uma descrença na política porque pelo menos desde 1991, após o
fim da URSS, o Capitalismo expandiu-se, produzindo riqueza porém concentrando-a
em poucas mãos. “A desigualdade é vergonhosa.” É o poder econômico
transnacional quem manda; o povo pode não perceber isso claramente, mas
constata que não consegue muita coisa com seu voto. O poder do Capital explica
a descrença nas instituições e na política.
É claro que não é sustentável uma
situação em que a fortuna pessoal dos 36 indivíduos mais ricos do mundo,
segundo a Oxfam, é igual à renda dos 4,7 bilhões de pessoas mais pobres
. Os problemas se evidenciam. Mas o sistema segue incutindo nas massas a ideia
de que é tudo natural, que assim operam as científicas leis de
mercado. E a extrema direita corre a arranjar bodes expiatórios para os problemas
contemporâneos. O fascismo latente se alvoroça.
O Capitalismo está devorando não apenas
corpos, consciências e instituições, como a própria Democracia. Com sua
voracidade ecologicamente insensível, poderá destruir o próprio planeta.
A esperança, segundo Ziegler e muitos
outros pensadores contemporâneos, está na sociedade civil; nos jovens; nos
movimentos alternativos.
Para preservar o sistema agonizante, os economistas mentem. Parafraseando Pessoa: mentem tão completamente, que chegam
a crer verdade aquilo que têm em mente. Martin Wolf, editor do Financial Times,
afirma que as universidades ensinam os estudantes de economia a “manipular
equações baseadas em suposições irrealistas”. Ou seja: existe a teoria, uma
fantasmagoria com adornos científicos; o trabalho é fazer a realidade
ajustar-se ao molde teórico. O nome disso é fundamentalismo econômico; mas
FRAUDE é nome ainda mais adequado.
Em 1929, às vésperas do Crash,
o economista Irving Fisher garantiu que tudo ia às mil-maravilhas na Bolsa. Em
2008, foi a vez de as famigeradas agências – oráculos para os os comentaristas
econômicos brasileiros – avalizarem a pujança daquela construção de nuvens
chamada mercado financeiro. Mais de 10 anos depois, ainda
sofremos os efeitos da “crise financeira internacional” – talvez um dos últimos
soluços do capitalismo terminal. Mas os economistas não desistem: mentem.
Mentem completamente.
Os jornalistas mercenários
replicam as mentiras. E uma multidão de pequenos-fascistas participa
animadamente do jogral.
Mas os mercenários não mentem apenas a
favor; eles mentem – e como! – contra. É preciso desqualificar os
contestadores, os oposicionistas. Aqui em Bananópolis, então, com seus milhões
de analfabetos funcionais e pequenos-fascistas, a tática funciona que é
uma beleza.
Acusar
políticos progressistas de corrupção é um velho expediente da direita para
desviar a atenção dos verdadeiros problemas e manter o status quo.
A Lula e
família, por exemplo, foram atribuídas quiméricas riquezas; mas nenhuma prova
foi apresentada. Em compensação, os atos de corrupção explícita e o
enriquecimento ilícito, de nomes do DEM, PMDB e PSDB foram solenemente
ignorados pela mídia e pela justiça.
“Prestidigitação é isso: enquanto o
mágico chama a atenção do público para detalhes sem importância, um elefante se
materializa no fundo do palco.”
“O elefante escondido nos bastidores é
o Poder Econômico Transnacional. Você não o vê porque ele é mantido oculto
pela mídia, cuja função, segundo o saudoso Millôr Fernandes, é ‘ocultar a
notícia’.”
Enquanto a mídia dá pirotécnico destaque
à corrupção de varejo, e praticamente todas as instituições (incluindo
as religiosas) endossam a cínica cruzada moralista, a “grande corrupção” (como
escreveu o também saudoso Pedro Porfírio há quase uma década), aquela praticada
pelos mundos corporativo e financeiro – essa fica nas sombras. Além do mais, o
mundo corporativo goza frequentemente de estímulos fiscais; ou
pode praticar sossegadamente a sonegação, mesmo, independentemente das
políticas dos governos amigos. Pior ainda é a corrupção legalizada,
expressa no comprometimento de metade do Orçamento Federal para o serviço
de uma misteriosa e jamais auditada “dívida” pública, regida por uma indecente
taxa de juros Selic. Aliás, foi para facilitar a vida dos banqueiros na questão
da “dívida” pública que Nelson Jobim perpetrou uma fraude no texto constitucional, como relatou o jornalista Sebastião Nery.
“Sim, o Elefante não consome
apenas minério, madeira, água, gente; como símbolo da hipertrofia cancerosa do
Capitalismo, o paquiderme é voraz consumidor de dinheiro. E frenético evacuador
de mentiras.”
E as mentiras são vorazmente consumidas
pelo cidadão que já foi chamado de vários nomes – coxinha, bolsominion,
pobre de direita – e que eu chamo de analfascista e, mais
recentemente, de pequeno-fascista. A doutrinação só funciona porque,
como expliquei já no 1º Manual de autoajuda do iludido político, a
índole do pequeno-fascista é uma mórbida mistura de egoísmo e ignorância
– psicopatia e oligofrenia.
O sociólogo Jessé de Souza é bem
explícito a respeito: “ Essa baixa classe média fascista existe no Brasil
há cem anos. O movimento fascista brasileiro, o Integralismo, tinha 500 mil
inscritos; é a mesma canalha que apoia o Bolsonaro.”
Como foi dito, a verdade dói – mas
liberta. Jessé não poupa o pequeno-fascista. Ele explica que foi a
melhoria de vida dos mais pobres que fez aflorar o atávico ódio escravagista na
elite e nas classes médias. Esse ódio ao pobre, talvez mais latente que
explícito em boa parte da baixa classe média (reduto do pequeno-fascista),
é uma das razões da eleição de Bolsonaro: muita gente comprou o velho discurso
do “combate à corrupção” e votou em mais um farsante moralista, assumidamente
“exterminador” de pobres e “comunistas”. Diz ainda Jessé que a imprensa,
tradicional representante do poder econômico, ajudou a eleger o fantoche
neonazista; mas previu que ela sentiria o peso do cerceamento das liberdades
democráticas.
Só recapitulando, para que as coisas fiquem
mais claras: O Capitalismo padece de câncer congênito; e o capitalismo
financeiro é a metástase terminal. Esse capitalismo é transnacional; destrói,
desumaniza, escraviza; arrota cinicamente a democracia que devora sempre que
ela é obstáculo à sua ganância. Bolsonaro é o representante da metástase
capitalista no Brasil.
Entendeu agora o papel que você cumpriu
quando bateu panela para derrubar Dilma e teve a impensável coragem de votar
num boçal nazista, escolhido para fazer o papel sujo a serviço do sistema
moribundo?
O artigo da professora Leda Paulani pode
ajudá-lo.
Não entendeu ainda? Não entendeu que
você, seu pai e seu avô são doutrinados desde a infância para odiar a “esquerda”,
o “comunismo”, a achar que o Capitalismo é a solução definitiva, que chegamos
ao “fim da História”? A doutrinação é feita pelo Capital Transnacional, através
da Fábrica de Zumbis: “A máquina de fabricar zumbis é tão eficiente que eles
julgam que realmente é vida e informação aquilo que é automatismo e
desinformação. Acreditam-se independentes e informados porque veem televisão,
leem revistas semanais e frequentam a Internet. E seguem vomitando nas
redes sociais aquilo que lhes foi inoculado desde que eram inocentes demais
para sequer desconfiar de que algo pudesse estar errado.”
Há uma tradição, no Brasil, de perseguições
a qualquer governo ou político que tenha um viés social. Getúlio, Jango,
Brizola, Lula e Dilma foram algumas das principais vítimas dessa tradição.
A tática é associar a pessoa à
“corrupção”; ou ao “comunismo”. De preferência, as duas coisas. Nos EUA dos anos
50, muitos anônimos e famosos, como Charles Chaplin, Orson Wells e o cientista
Robert Oppenheimer foram acusados de “comunistas”. O Brasil – é claro –
importou essa política persecutória, que ficou conhecida como Macarthismo. Lá
como cá, jamais se conseguiu provar qualquer acusação; mas, lá como cá, muitos
tiveram suas vidas destruídas.
Lá como cá, não apenas a polícia e a
justiça atuaram na operação que ficou também conhecida como “caça às bruxas”: a
mídia teve papel fundamental na lavagem cerebral da população, de modo a
estimular as delações; criou-se um stalinismo à americana, assim como
haveria entre nós um stalinismo à brasileira.
Na década de 50, seu avô foi levado pela
mídia, um dos principais setores da Fábrica de Zumbis, a acreditar que o
Palácio do Catete, onde se abrigava Getúlio, estava imerso num “mar de lama”.
Na década de 60, seu pai acreditou que João Goulart era simultaneamente
“corrupto” e “comunista”... Na segunda década dos anos 2000, foi a sua vez de
fazer o que a elite espera de um pequeno-fascista: acreditar que o PT
estava “roubando” e “quebrando” o Brasil. Já na década anterior, na verdade,
todo mundo – avô, pai, filho – havia torcido fanaticamente para que o PT
naufragasse em mais um dos escândalos forjados: o Mensalão. Mas o governo
resistiu. Anos depois, a sucessora de Lula, no segundo mandato, seria
atropelada por um impeachment fraudulento, para que a elite pudesse manipular à
vontade o fantoche Temer. O pequeno-fascista delirou.
Mas era necessário neutralizar Lula, que
poderia concorrer novamente em 2018 e era o favorito disparado nas pesquisas.
Então o poder econômico mobilizou Moro Imoral, os procuradores de pelo em ovo,
e armou-se contra Lula uma fraude judicial que só tem paralelo em julgamentos
como os promovidos pela Santa Inquisição, os realizados sob o Nazismo, o
Stalinismo. o Macarthismo. 122 notáveis juristas escreveram um livro –
“Comentários a uma sentença anunciada – o processo Lula” – para provar que o
processo contra Lula era uma fraude. Mas prevaleceu a narrativa divulgada pela
mídia desonesta e decadente.
A mídia mentirosa sempre apresentou a
corrupção como causa das mazelas brasileiras. E em geral infla a imagem de um
espantalho anticorrupção que irá servir aos interesses do Grande Capital. Em
1989 foi Collor; em 2018, o inacreditável Bolsonaro. O pequeno-fascista sempre
adere à farsa.
Mas agora a decepção com o Boçal Nazista é grande: os machos-analfas
não conseguiram comprar suas armas, a precarização do trabalho é maior do que
nunca, a economia se arrasta. O pequeno-fascista, agora, voltou à cantilena de
que “político é tudo igual”. Mas, no fundo de sua mente deformada pela
lavagem-cerebral, deve pensar: “Pelo menos tiramos o PT.” (Mais uma vez peço
perdão ao leitor pela facada psicanalítica. A verdade dói, mas liberta.)
O Capital Transnacional, que também não
está muito satisfeito com monstrengo desastrado que construiu, já há tempos vem
pensando em novos fantoches: o juiz criminoso Sérgio Moro, o apresentador manipulador
Luciano Huck, quem sabe algum pastor bilionário, que vai atrair hordas de um tipo
especial de pequeno-fascista: o evangélico... O pequeno-fascista compra todas
as farsas e farsantes. Porque o poder econômico sabe como manipular o medo que ele
tem do ‘comunismo’, assim como sua ganância, seu egoísmo, o desprezo e terror
que lhe inspiram os mais pobres. O pesadelo do pequeno-fascista é que uma onda
de miseráveis o arraste de sua precária praia de triviais satisfações mundanas
ao oceano insondável da pobreza. Em momento algum ele pensa em construir uma
nova sociedade, um mundo feito de solidariedade, cooperação, empatia.
Ou seja: o pequeno-fascista é um
soldadinho perfeito do exército do Capital Transnacional, que promove uma
permanente guerra contra inimigos singulares e indefectíveis: o Tempo, a
Mudança, a História.
4 comentários:
Está bem claro o que ocorre, o problema foi a esquerda ter flertado com isso, ao invés de enfrentado quando foi governo.
Agora chegamos no limite, ou enfrentamos de forma clara a não confundir as pessoas, ou pereceremos de vez.
Nelson, seu artigo é cirúrgico ao apontar as razões de nossa situação atual, mas é também de uma grande amplitude, tanto de abrangência espacial quanto histórica. Parabéns!
Agora é preciso ir além dos convertidos, para tentar reduzir a ignorância dos bolsominions, ao menos.
Como me situar nesse cenário? Nasci, fui alimentada, educada e vivo em berço neo-fascista. Mas carrego comigo um profundo amor e respeito à vida e, portanto, tenho um senso e sede de justiça insaciáveis. Tanto que vertem lágrimas inúteis dos meus olhos ao ler um artigo raio-X tão transparente como esse. Tenho lido, assistido material, consultado amigos econo mistas e especialistas em comportamento e desenvolvimento humano, bem como me inteirado das ferramentas e métodos que tem sugestionado e manipulado a psiquê das massas. Pelo que sei até agora, tudo em seu texto corresponde, com fidelidade, ao panorama real da linha do tempo humano. Me parece tão pouco o que tenho feito. Falando com amigos, parentes, participando discussões
em grupos, redes sociais, dando aos meus filhos o espaço amplo para expressão e material para que desenvolvam sensos e se tornem autodirigidos, não fantoches, como eu fui, durante trinta de todos os meus anos. Compro do pequeno produtor que passa na minha porta, procurando favorecer aos pequenos em detrimento das grandes redes de fornecimento, queridas pelo sistema. Reciclo. Minimalizo consumo. Me posiciono, sobretudo quanto à política religiosa. Perdi muitos amigos e até relações com parentes por isso, mesmo com o zelo de não ser reativa e não responder à altura aos ataques pessoais (tática de oposição suja por falta de argumentos factuais). Me parece pouco. Por vezes inútil. Não, não é reconhecimento que me falta, pois já não sou condicionada à isso. Mas gostaria mesmo de saber o que mais posso fazer pra ir na contramão do ciclo de autodestruição acelerado em que entramos, nós, humanos, egoicamente destruidores das outras espécies também. Eu gostaria de um conselho. Grata pelo trabalho e esforço intensos, tempo, dinheiro, capital intelectual e, bem possivelmente, relações interpessoais investidos, dos quais resultou esse texto perfeito e outros materiais de sua autoria! Quando as pessoas olham para um fruto saboroso, lindo, cheiroso e nutritivo, nunca pensam no tamanho do esforço da árvore. Muitas vezes não degustam corretamente, descartam e ainda cortam a árvore, subnutridos de empatia com a vida que são. Muito grata!
Excelente!
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